O AQUÁRIO
Adalberto
morava só. Viera do interior para estudar e trabalhar, jovem ambicioso e
determinado.
Sua
mãe, velha senhora de hábitos antigos, como cozinhar, lavar e passar para toda
família, viera visita-lo e verificar as suas condições de moradia. Depois de
muitos conselhos e recomendações, partira , rebolando suas largas ancas, com
uma velha mala na mão.
Deixou
para o filho, um aquário com dez peixinhos coloridos e com uma recomendação
curiosa:- Meu filho, cuide dos peixinhos.... E preste sempre muita atenção!
A
vida foi prosseguindo para Adalberto.
-
Levantou-se de manhã, muito preocupado com a nova tarefa a realizar no
trabalho. Teria que usar
termos em inglês, sendo que mentira no processo de admissão da empresa. Não era
fluente no idioma. - No aquário nadavam alegres nove peixinhos
-
Chegou curtindo seu novo aparelho celular. Quantas facilidades. Equipamento de
ponta e ele totalmente envolvido com essa maravilha. -No aquário, oito
peixinhos se preparavam para dormir.
-
Brigou com a namorada. Estava arrasado. Ela era muito intransigente, todo mundo
sabia que a Lucinaura era uma “peguete”...quer dizer..ele é que não ia ficar
para trás. Homem que é homem não recusaria sair com aquela gata. Arrumaria
outra namorada. Namorar com a “peguete”? Nem pensar. –Sete peixinhos brincavam
no aquário.
-
Desespero total. Não sabia dar nó na gravata. Tinha comprado aquela roupa ,
para acompanhar a diretoria na reunião com os americanos..e agora..não
conseguia acertar um mero nó na gravata. Lembrou do vizinho, bateu à porta do
mesmo e ei-lo em poucos minutos, entrando no elevador todo “pimpão”, rumo ao
sucesso. Seis peixinhos davam voltas naquele navio de mentirinha, parado no
fundo do aquário.
-
Compraram a empresa. E agora? Seria demitido? Olhava para a xícara de café frio
sobre a pequena mesa da cozinha. Tinha fome, mas não queria comer. Abriu a
geladeira que mostrou-se vazia, esquecera de ir ao supermercado. O jeito foi se
virar abrindo a lata de sardinha. Nossa, estava esquecendo de alimentar os
peixinhos, agora os cinco, abriam as
boquinhas famintas para colher a ração despejada de qualquer jeito.
-
Fim de semana, tinha que dar uma arrumada no pequeno apartamento. Fez isso com
maestria, graças aos sempre providenciais ensinamentos da mãe. Arrumou no armário
, as novas e alinhadas roupas, adquiridas recentemente e vindas da lavanderia.
Quatro peixinhos coloridos e serelepes, brincavam nas aguas levemente turvas.
-
Tudo ia muito bem, fora demitido, mas já arrumara um novo e promissor emprego.
Foi assim à jato. Sentia-se muito confiante e bom mesmo. Ninguém precisava
saber que ele assim, “sem querer”, se apropriara da ideia de um antigo colega e
a apresentou como sua, na outra empresa. Que importância tem isso? Dois
peixinhos coloridos nadam distantes um do outro, dentro de um aquário embaçado.
-
Preparava-se para sair com novos amigos. Um restaurante da moda, com algumas
garotas lindas, bebida cara, estreava um carro novo. Já fazia prospecções para
a aquisição de um apartamento, afinal com as ultimas promoções meteóricas,
estava com bom saldo bancário. Também, quem mandou aquele gerente otário querer
bancar o “paizão” e lhe ensinar todos os caminhos e abrir-lhe todas as portas?
O gerente já estava velho e era hora de descansar. Deixem o mundo para os mais jovens,
que sabem “viver a vida” como deve ser vivida. No aquário, um peixinho triste e
solitário, nadava perdido em seus próprios pensamentos...
-
Finalmente iria para o novo apartamento, e com uma aliança no dedo direito.
Ficara noivo da bela herdeira de uma família de muitas posses. Não fez mudança
, pois nada levaria, tudo o que havia no pequeno e antigo apartamento, doou
para o zelador. Acondicionou suas melhores roupas em duas pequenas malas e
preparou-se para partir.
Ao
sair, deu uma ultima olhada ao redor e observou sobre um pequeno aparador, um
recipiente de vidro, que lembrou-se ser o aquário que sua mãe lhe dera. Para
onde foram os peixes? Não se lembrava ou não notara quando e como eles sumiram!
Nesse momento sentiu quase que a presença física de sua velha mãe, que morrera
há dois meses, vitimada por uma dessas doenças que paralisam o coração.
Ele
não pode ir ao enterro, pois fazia sua primeira e importante viagem ao
exterior, numa missão de trabalho. Mas, para que lembranças tristes, - Vamos em
frente! - Pensou
Entrou
rapidamente no elevador que parou logo no andar seguinte. Uma senhora
simpática, que ele nunca vira antes, entrou apressada e abriu-lhe um enorme
sorriso , mostrando alguns dentes postiços e uma pele levemente enrugada. Sem mais,
foi falando assim num rompante: - Vou ali em frente, naquela lojinha para
comprar uns peixinhos para o meu neto colocar no aquário.
Pensei em dar peixes coloridos, mas acho que ele vai preferir os dourados. Ouro
é sempre ouro..me entende? O elevador chegou, ela abriu a porta, não sem antes,
dar uma piscadela e sumiu em meio às luzes incertas daquele final de tarde,
deixando-o para trás, parado com as malas na mão e vários peixinhos “na
cabeça”.
Lenice Duarte Melero
29/06/2012
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